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sábado, 31 de agosto de 2013

"Os Marretas"

          

Os marretas foi uma antiga designação que os brasileiros deram aos portugueses, que de modo algum aceitavam os ventos da História e porfiavam em manter o Brasil como colónia de Portugal, mesmo quando, José Bonifácio de Andrade e Silva sonhava com o Grito do Ipiranga.
Em Portugal os marretas deste tempo são os actuais dirigentes do PS que contra tudo e contra todos não aceitam rever a Constituição da República Portuguesa, quando tudo aponta para a sua necessidade política-institucional, tendo-se em conta que o texto aprovado em 2 de Abril de 1976 dotou a Assembleia da República de poderes de revisão constitucional que já foi exercida por sete vezes.
Pela 1ª vez  entre Abril de 1981 e 30 de Setembro de 1982 para rever o articulado inicial, para consagrar a transição para o socialismo (pasme-se!).
Pela 2ª vez em 1989 que deu maior abertura apo sistema económico, pondo termo à irreversibilidade das nacionalizações.
A 3ª e a 4ª , respectivamente, em 1992 e 1997 adaptaram o texto aos princípios dos Tratados da União Europeia, Maastrich e Amsterdão.
A 5ª revisão ocorreu em 2001 com o fim de permitir a ratificação por Portugal, da Convenção que criou o Tribunal Penal Internacional, alterando as regras de extradição.
A 6ª revisão foi aprovada em  2004, "aprofundou a autonomia político-administrativa das regiões autónomas dos Açores e da Madeira, designadamente aumentando os poderes das respetivas Assembleias Legislativas e eliminando o cargo de “Ministro da República”, criando o de “Representante da República”.
Foi ainda aprovado o princípio da limitação dos mandatos executivos.
A 7ª e última revisão em  2005, que através do aditamento de um novo artigo, permitiu a realização de referendo sobre a aprovação de tratado que vise a construção e o aprofundamento da União Europeia.
Esta alteração constituirá,  para sempre, a maior das vergonhas, porque, embora aprovada a consulta ao povo - que para tanto obrigou a rever a Constituição - tal acontecimento não existiu, o que provou, o respeito que os parlamentares da época tiveram com o povo que os elegeu.

Tudo o que fica escrito serve de intróito para falar dos "marretas" deste tempo e se alinham, como já se disse nos parlamentares do PS que deveriam ter mais senso político e deixarem de cerrar fileiras contra a 8ª revisão da Constituição que urge fazer, porquanto os ventos da História são outros - a começar pelo facto de não cunharmos moeda, não podendo, portanto, alterar o seu valor facial - e, desse modo, com as alterações atinentes que se tornam urgentes tornar o País mais governável, chegando ao despautério de acusar o governo de não saber viver com a Constituição.
São assim os marretas em qualquer tempo e lugar.
Já assim o foram, no seu tempo, os portugueses do Brasil, como já se apontou.
Assim o são os actuais parlamentares do PS... até quando?
Será que receiam ver retirado da Constituição o princípio (anómalo) de que Portugal caminha para a transição para o socialismo?
Mas... então, um povo caminha para onde o querem mandar?
Será que a Constituição da República Portuguesa é uma "quinta" do PS?
 
 
Quanto ao Tribunal Constitucional - um órgão não eleito mas advindo do Parlamento - deveria ser mais comedido nas suas decisões - que seguindo a Lei - deveria entender, que a Lei Fundamental que temos é fundamentalista e não está de acordo com o tempo que passa e, só, por isso, as suas decisões não deviam ser tão fundamentalistas.
Merece-me esta crítica.
O País está acima de qualquer Lei, sobretudo, quando ela não é mudada pela acção destemperada de uns certos "marretas"...
E, já agora, que o Sr. Presidente do TC deixe de dar entrevistas - como a que aconteceu no passado dia 29 de Agosto - para justificar o facto de só metade dos juízes se reunirem para decidir, quando em acórdãos, como a que estava para decidir - Requalificação da Função Pública  - porque, todos juntos é que fazia sentido e não uma parte, por se saber que os doutos magistrados são escolhidos pelo Parlamento...
Este facto, por si só, devia impedir os senhores juízes de se reunirem como bem entendessem e respeitarem o "quórum" no respeito pelo todo do colectivo.
Não são "marretas" no sentido que é dado aos paramentares do PS, mas que com a sua acção - embora legal - têm dado violentadas marretadas a um Estado falido, não restam dúvidas, agindo em cima de uma Lei que está fora do tempo.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

21º Domingo do Tempo Comum - Ano "C" 25 de Agosto de 2013


Jesus atravessava cidades e povoados, ensinando e prosseguindo o caminho para Jerusalém. Alguém lhe perguntou: “Senhor, é verdade que são poucos os que se salvam?” Ele respondeu: ”Esforçai-vos por entrar pela porta estreita. Pois eu vos digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão.  Uma vez que o dono da casa se levantar e fechar a porta, vós, do lado de fora começareis a bater, dizendo: ‘Senhor, abre-nos a porta!’. Ele responderá: ‘Não sei de onde sois’. Então começareis a dizer: ‘Comemos e bebemos na tua presença, e tu ensinaste em nossas praças! Ele, porém, responderá: ‘Não sei de onde sois. Afastai-vos de mim, todos vós que praticais a iniqüidade! E ali haverá choro e ranger de dentes, quando virdes Abraão, Isaac e Jacó, junto com todos os profetas, no Reino de Deus, enquanto vós mesmos sereis lançados fora. Virão muitos do oriente e do ocidente, do norte e do sul, e tomarão lugar à mesa no Reino de Deus. E assim há últimos que serão primeiros, e primeiros que serão últimos”. (Lc 13, 2-30)
 
Senhor Jesus:
jamais te perguntarei
se serei dos teus eleitos...
daqueles que se salvam.

Aceito e quero ligar
todas as tuas Palavras
e como for capaz
quero vivê-las e, seriamente.
Desejo ser daqueles
que vive à procura "da porta estreita".
no desejo de entra, um dia,
apenas com a bagagem
cheia de Ti.
Permite, pois,
aberta para mim
a "porta estreita" que dá acesso
ao banquete da Salvação.

Que para tanto me vá libertando
do supérfluo, do orgulho,
da avareza e, sobretudo,
da arrogância da injustiça
que pode ceifar a coerência
que tenho de manter
entre o que digo e faço
em Teu Nome!


quinta-feira, 29 de agosto de 2013

"Universidades de Verão"

in, Livro Infantil nº 2 - "Vamos Adivinhar Profissões" de Soledade Martinho Costa
 
 
As "Universidades de Verão" dos Partidos Políticos PS; PDC e CDP-PP, aí estão mais uma vez, para gáudio dos políticos  que nos governam ou estão na oposição, no pressuposto de aprenderem um pouco mais ou, de cultivarem o modo de enganar melhor os seus eleitores com arte e engenho e, no geral, todos os portugueses.
O PSD quer imediatamente fazer-nos crer que há uma fresta de luz ao fundo do túnel. O CDS-PP vai passar por cima daqueles - que no próprio governo - não têm a sua simpatia e, por último, o PS vai centra a suas setas envenenadas em Passos Coelho.
Tudo isto é previsível.
Como é, assim, mais uns dias de propaganda que é algo que os políticos da esquerda à direita gostam de fazer... e, alguns, com muita arte...convenhamos!
 
 

Começando pelo último dos partidos acima referidos, O PS - logo no 1º dia - trouxe o alcaide de Vigo e ouviu ditames sobre a sua experiência e lições sobre a gestão municipal, como se entre nós não houvessem especialistas, tendo as honras da casa - Palácio D. Manuel (1) - cabido aos reitores Àlvaro Beleza e Jorge Seguro Sanches, com este último a proferir uma afirmação "cultural" de grande gabarito: para ele "Num passado muito recente foi a direita, PSD e CDS, que tudo fez para que a troika viesse para Portugal."
E logo eu, que pensava que tinha sido o governo do Sr. José Sócrates...
Pensava e continuo a pensar - como a maioria dos portugueses independentes - e não há académico nenhum que me faça pensar o contrário.
Penso, aliás, que o Sr. Reitor chumbou nesta lição ao querer branquear uma nódoa negra do governo anterior... mas isto só pode surpreender os que ainda não deram conta que existe todo um afã nas hostes socialistas em puxar para cima a figura de José Sócrates e deitar para baixo o actual governo - que com as suas inabilidades e muitas dificuldades, temos de o dizer - têm vindo a deitar tiros nos pés, mas que, como pode está a tentar manter à tona de água um País afundado, que alguns - como o Sr. Reitor Jorge Seguro Sanches - fingem não ter visto... ou então, o que pretendem é enganar os incautos.
Com esse mesmo propósito, no dia 29 de Agosto o dirigente Eurico Brilhante Dias considerou hoje o Governo “o principal foco de instabilidade política” no país, o que prova à evidencia o nível cultural deste brilhante "académico", que o argueiro no olho do vizinho e não viu e continua a não ver a trave no seu próprio olho...
E basta.
 
 
O PSD vai-nos "convencer" que há uma freta de luz ao fundo do túnel e vai evitar de falar em Victor Gaspar, mas seria bom que nas várias "aulas" o documento de despedida do ex- Ministro das Finanças fosse reflectido e, assim, dar-se-ia ao povo eleitor daquele Partido e aos portugueses em geral uma satisfação, quanto ao problema que o levou a demitir-se.
Vejamos os pontos nucleares da sua carta de despedida que não devem ser ignorados:

(…) O nível de desemprego e de desemprego jovens são muito graves. Requerem uma resposta efectiva e urgente a nível europeu e nacional. Pela nossa parte exigem a rápida transição para uma nova fase de ajustamento: a fase do investimento! Esta evolução exige credibilidade e confiança; (…) assegurar as condições internas de concretização do ajustamento são uma parte deste fardo (da liderança). Garantir a continuidade da credibilidade externa do país também. Os riscos e desafios dos próximos tempos são enormes. Exigem a coesão do Governo. É minha firme convicção que a minha saída contribuirá para reforçar a sua liderança e a coesão da equipa governativa.

É que, depois da demissão de Victor Gaspar está o País mais preparado para levar a Carta a Garcia, nos pontos apontados? Tem o governo mais coesão e credibilidade? Qual a política a seguir para fazer baixar o desemprego? Com se vai consolidar a Reforma do Estado? Como vamos dar corpo a uma política que nos faça crescer?
Infelizmente, temo que nada disto vai ter resposta dos "académicos" da nossa política, que se vão entreter em mais uns dias de verborreia e maldizer, deixando tudo para ser discutido após o dia 29 de Setembro - eleições autárquicas - que muito vai influenciar as "aulas" destas "Universidades de Verão", cujo nome copiado das verdadeiras "Universidades de Verão" da nossa Academia, só no nome são iguais.
Quanto ao resto, convém esquecer...

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(1) - O Palácio de D. Manuel é o que resta do grande conjunto palaciano de S. Francisco, pois foi a partir do Convento de S. Francisco. Coube ao rei D. Manuel I, o Venturoso, que subiu ao trono em 1495, imprimir ao conjunto monumental a grandiosidade e a beleza arquitectónica que ostentava. Hoje, cumpre a função de “sala de visitas” da cidade.



segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Cândido Guerreiro (1872-1953)


Cândido Guerreiro (Francisco Xavier) é natural de Alte.
Frequentou a Universidade de Coimbra onde se formou em Direito em 1907, tendo dado à estampa antes da conclusão do curso académico alguns dos seus livros, mercê dos quais, se distinguiu no meio dos seus pares e dos seus leitores.
Foi um exímio cultivador do soneto que lapidou até ao extremo da sua veia poética, emprestando a muitos deles a paisagem da terra algarvia que lhe serviu de inspiração, bem como o do amor pátrio.
Exerceu o notariado em Loulé e em Faro no período que mediou entre 1923 e 1941.
Tem uma vasta obra poética, iniciada com o livro "Rosas Desfolhadas (1895) a que se seguiram: "Pétalas" (1897); "Avé Maria" (1900); "Sonetos" (1904); "Balada" (1907); "Eros" (1907); "Glicínias" (1925); "Promontório Sacro" (1929; "Rainha Santa" (1934); "Auto das Rosas de Santa Maria" (1940); "Às Tuas Mãos Misericordiosas" (1943); "Sulamítis"(1945); "Avante e Santiago" (1950).
Pela data da publicação dos seus livros podemos concluir que Cândido Guerreiro encheu a vida de poesia até quase ao fim da vida, o que atesta de quanto valiosa lhe foi a veia artística que teve no "Auto das Rosas De Santa Maria" uma das suas maiores expressões.
Exímio sonetista, a sua arte poética atinge um dos muitos cumes que o distinguem, no soneto: INTANGÌVEL, onde se adivinha em cada verso a música de uma sobrenaturalidade procurada em Nossa Senhora, e que ele exprimiu deste modo:
 
No vôo em que me elevo a procurar-te,
Mergulho no Infinito, e até parece
Que um murmúrio de cântico e de prece
Me embala a vai comigo em toda a parte...
 
E toda a sombra má desaparece,
E toda a luz é para iluminar-te,
A música de Deus para cantar-te,
Por ti se enflora a terra e o sol aquece...
 
Por ti, que enches o mundo e não te vejo,
Onda incorpórea e hálito disperso,
Nuvem de sonho e fogo de desejo!
 
Por ti, que diluída no Universo,
És o dulçor que encontro em cada beijo,
A harmonia que busco em cada verso!...
 
in "Sonetos"
 
É patente nesta bela composição de 1904 - antes da sua formatura - o hálito disperso daquela inefável Senhora da Assunção - orago de Alte -  de que ele diz que toda a luz é para iluminar-te  e que representou em Cândido Guerreiro não só a harmonia que ele pôs em cada verso como o mistério do mundo estar cheio da sua Presença, que o Poeta exalta de um modo que torna este soneto um dos mais belos dirigidos à Mãe de Deus na língua portuguesa.
Alte não esqueceu este ilustre filho.
Erigiu-lhe no jardim da Fonte Pequena o monumento que acima se reproduz em homenagem ao Poeta que na primeira estrofe de um outro soneto, retrata assim a sua terra:

Porque nasci ao pé de quatro montes
Por onde as águas passam a cantar
As canções dos moinhos e das fontes
Ensinaram-me as águas a falar.
 
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Fujo, ou não?

in, Revista "O Foguetão" de 15 de Junho de 1961
 
 
O náufrago da imagem sou eu.
Cansado das mentiras e jogos políticos, como o da destruição de documentos importantes de trabalho dos contratos "swaps", que segundo a Lei que os rege, de acordo com as recentes notícias deveriam ter ficado após os três primeiros anos, guardados por um período de mais 17 anos num "arquivo intermédio", e desse modo permitir-se a sua consulta durante duas décadas no que respeitava a "swaps" contratados pela Refer, Metro de Lisboa, Metro do Porto e TAP, foi a gota de água que faltava para encher o copo da minha paciência.
Retirei-me para a minha "ilha" disposto a deixar esta parte do planeta chamada Portugal onde, desde há muito tempo, está a faltar a vergonha.
Tive sorte.
Passou uma aeronave extraterrestre e lançou-me a escada para que subisse para bordo.
Fujo, ou não? - pensei.
Mas, vai daí, fiquei a cogitar se merecia a pena.
Fiquei a pensar se naquele "mundo" estranho - como acontece por cá - o velho pensamento de Aristóteles: "A justiça neste mundo é uma teia que apanha os mosquitos, mas deixa passar os pássaros", pela injustiça do tempo, não é lá, também, o pão nosso de cada dia...
E não subi a escada.
Fiquei na minha "ilha" à espera de um tempo melhor em que a teia da justiça  apanhe, como convém a uma sociedade que dizem ser civilizada, não só os mosquitos, mas também, os pássaros e, se possível, para a higienização da "gaiola" os passarões que dão ordens aos pássaros.

 

20º Domingo do Tempo Comum - Ano "C" 18 de Agosto de 2013


Eu vim lançar fogo sobre a terra, e como gostaria que já estivesse aceso!  Um batismo eu devo receber, e como estou ansioso até que isto se cumpra!  Pensais que eu vim trazer a paz à terra? Pelo contrário, eu vos digo, vim trazer a divisão. Pois daqui em diante, numa família de cinco pessoas, três ficarão divididas contra duas e duas contra três; ficarão divididos: pai contra filho e filho contra pai; mãe contra filha e filha contra mãe; sogra conta nora e nora contra sogra.
(Lc 12, 49-53)
Lido sem uma pausa
introspectiva,
o Evangelho deste dia
parece difícil de compreender.
Mas se meditarmos de que fogo
e de que divisão se trata,
concluimos que Jesus falou
de um fogo santo para limpar o mundo
das impurezas e da divisão
a que temos de atender,
porque, ao trazer a Paz de Deus
entre os homens, anunciou a "arma
geradora dessa paz: a "Verdade".

E esta "Verdade" era algo
que teria de incomodar
todos os que se comprometem,
verdadeiramente com a vida,
especialmente, os bem instalados
e os agentes da mentira,
vivam onde vivam:
no mundo ou na própria família,
sempre que não ouvem a voz de Deus!

Foi para isto que Jesus veio:
para incendiar os nossos corações,
na certeza que,
se é da tempestade da noite
que nasce o dia claro,
é em cima da divisão
- ou seja, do abalo da consciência -
que é possível construir a paz
se agirmos segundo a Verdade
que Ele deixou pregada na Cruz!

domingo, 25 de agosto de 2013

António Feijó (1862-1917)


 
 
António Joaquim de Castro Feijó nasceu em Ponte de Lima e faleceu na Suécia no exercício das suas funções diplomáticas.
Oriundo de uma antiga e ilustre família do MInho, cujo vínculo remonta ao início da nacionalidade com o casamento de Gil Pires Feijó com uma filha de Soeiro Viegas Coelho, bisneto de D. Egas Moniz, pode-se afirmar que na segunda metade do século XIX, após o desenrolar de muitas linhagens, António Feijó representou a geração que nele despontou o Poeta e o diplomata.
Estudou em Braga, onde fez os preparativos que antecederam a sua entrada na Universidade de Coimbra, em 1877, onde, segundo se diz, intercalava nas páginas das sebentas o saber dos mestres e o despontar das suas poesias, que cedo o tornaram acarinhado pela Academia.
É contemporâneo das figuras que Trindade Coelho imortalizou em "In Illo Tempore", esse relicário preciosos de uma certa boémia coimbrã que fez época e marcou um estilo.
António Feijó publicou o seu primeiro trabalho literário "Sacerdos Magnus" em 1881, aquando da exaltação do centenário de Camões, seguindo-se-lhe: "Transfigurações" (1882); "Líricas e Bucólicas" (1884); "A Janela do Ocidente" (1885); Cancioneiro Chinês" (1890); "Ilha dos Amores" (1897); "Bailatas" (1907) como pseudónimo: Inácio de Abreu e LIma; "Sol de Inverno" (1922); "Novas Bailatas" (1926) sendo estes dois últimos livros póstumos.
De carácter epigráfico em as "Transfigurações" o Poeta transfigurou-se nas "Líricas e Bucólicas" tocado por um lirismo romântico contra ao paladinos de um acerta intervenção de ordem social.
Na "Janela do Ocidente" são evidentes as suas dúvidas, próprias de quem segue a apalpar o caminho, onde parece ter feito uma paragem para meditar, de que resultou uma espera de cinco anos para a publicação de um outro livro.
Aconteceu ao Poeta o que é normal em espíritos que procuram a perfeição, de que o "Cancioneiro Chinês" com as adaptações que fez de poetas do século oitavo da dinastia de Tang, são exemplo.
Não deixa de ser sublime na "Ilha dos Amores" onde reúne em grande número, ardentes composições que revelam em toda a extensão uma saudade de Portugal, como resultado da sua permanência em Estocolmo, no exercício da sua carreira diplomática iniciada no Brasil, no Rio Grande do Sul, em 1886.
Na Suécia fixara-se como ministro  plenipotenciário, onde casou em 1900 com uma natural, cuja beleza e virtudes sociais eram atributos de tal modo notados que a sua morte em 1915, viria a influenciar a obra do Poeta publicada após a morte da esposa, a ponto de Alberto de Oliveira ter dito com a morte de António Feijó, dois anos após, "o que morreu de amores".
Dez anos depois, o governo sueco enviou num barco de guerra, a Portugal, os restos mortais do Poeta e de sua amantíssima esposa. No ano de 1938 a Câmara Municipal de Ponte de LIma erigiu um monumento em memória do filho ilustre.
A poesia de António Feijó que os estudiosos situam no Parnasianismo é de uma grande riqueza expressiva quanto à forma e metro.
De grande esmero, a roçar a perfeição, os seus versos discorrem sem artifícios, naturalmente, melodiosamente, de que é exemplo a composição:
 
AQUELA QUE VEIO TARDE
 
Corpo de arminho, alma de arminho,
O teu perfil espiritual
Lembra uma santa iluminada em pergaminho
Num Livro de Horas medieval.
 
De rendas finas como penas
Feitas num místico tear,
As tuas mãos parecem duas açucenas
Desabrochando ao luar.
 
Branco de neve e luar coalhado
Sobre magnólias a entreabrir,
Teu lácteo seio é como um ninho imaculado
Onde os meus sonhos vão dormir.
 
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Que direi eu que mais exalte
Essa figura espiritual
Ó minha santa iluminada a oiro e a esmalte
Num Livro de Horas medieval?
 
Avá-Maria! É este o grito
Em que os meus versos se condensam,
Quanto te vejo e o teu olhar, sempre bendito
Cai sobre mim como uma bênção...
 
in, "Ilha dos Amores"
 

Queiroz Ribeiro (1860-1928)


À multidão que segue, deixo exposto
Como um cartaz à fúria das nortadas
Este colar de pedras lapidadas
Pelas Mãos da Ternura  e do Desgosto.

(in, Pedras Falsas)


Gaspar de Queiroz Ribeiro nasceu na Guarda, a velha cidade que segundo um rifão popular é denominada fria, farta e forte.
Teve larga interferência na vida política do seu tempo, havendo publicado em 1908 os seus discursos como imagem da sua vida parlamentar, que são uma nota da sua profunda vida interior e espelho das suas ideias, pelas quais se viu obrigado a exilar-se em Espanha, vítima do Movimento Monárquico do Norte.
Na Pátria de Cervantes viveu, por este motivo vários anos da sua exiatência, sofrendo as dores da ausência da Guarda, onde então vivia Augusto Gil, o mimoso Poeta de o "Luar de Janeiro".
Queiroz Ribeiro foi um lírico de grande enternecimento e de tão  elevada inspiração que ela foi, já no declinar da vida a encetar estudos religiosos de que muito a sua poesia veio a lucrar.
Nessa fase singular deu-se ao trabalho de fazer uma adaptação da Bíblia, em verso, empresa que não chegou a concluir.
O seu primeiro livro foi publicado em 1889.
Chama-se "Tardes de Primavera" e teve na sua primeira edição uma carta-Prefácio de Guerra Junqueiro, seu grande admirador e amigo.
Seguiram-se "Cinzas" (1896); "Pedras Falsas" (1903); "Caminho do Céu" (poema- 1906); "Folhas Mortas" (1916), "Imitação de Cristo" (1925).
Morreu roído de saudades pela esposa amantíssima que ele evoca em "Cinzas", numa poesia amara e onde a sinceridade da sua dor se retrata com toda a fidelidade que a sua alma lhe deu.
Em o "SEGREDO" o belo poema das "Pedras Falsas" o Poeta divaga entre a liberdade do lirismo que fez baixar a lua do céu ao lago e aquilo que parece ser - e não é - uma confusão de sentimentos, porquanto, a procura na ânsia de felicidade e, ao mesmo tempo, o maldizer de a encontrar, são faces de uma mesma moeda a que ele chama "mistério" e tal modo interiorizado que e em existe em si e si ficou.
 
 
Descansa. Nem tu sabes, nem eu digo!
A lua, que baixou do céu ao lago
Não adivinha se a deixei... se a trago
Dentro da alma, como um sonho antigo.
 
O néctar que eu procuro e que maldigo,
O vinho, que abençoa a cada trago,
Este veneno com que me embriago
É mistério dum só: irá comigo!
 
Por que suplicas que me dê, que fale?
- Porque não sabes quanto a noite vale
E não calculas como é bom assim!
 
Bem sinto a dor que o teu olhar goteja.
Mas o Princípio por melhor que seja
É pai dum monstro que se chama Fim!
 

sábado, 10 de agosto de 2013

19º Domingo do Tempo Comum - Ano "C" 11 de Agosto de 2013


Não tenhas medo, pequeno rebanho, pois foi do agrado do vosso Pai dar a vós o Reino. Vendei vossos bens e dai esmola. Fazei para vós bolsas que não se estraguem, um tesouro no céu que não se acabe; ali o ladrão não chega nem a traça corrói. Pois onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração. “Ficai de prontidão, com o cinto amarrado e as lâmpadas acesas. Sede como pessoas que estão esperando seu senhor voltar de uma festa de casamento, para lhe abrir a porta, logo que ele chegar e bater. Felizes os servos que o Senhor encontrar acordados quando chegar. Em verdade, vos digo: ele mesmo vai arregaçar sua veste, os fará sentar à mesa e passará para servilos. E caso ele chegue pela meia-noite ou já perto da madrugada, felizes serão, se assim os encontrar! “Ficai certos: se o dono da casa soubesse a que horas viria o ladrão, não deixaria que fosse arrombada sua casa.  Vós também ficai preparados! Pois na hora em que menos pensais, virá o Filho do Homem”. Então Pedro disse: “Senhor, é para nós ou para todos que contas esta parábola?”  O Senhor respondeu: “Quem é o administrador fiel e atento, que o senhor encarregará de dar à criadagem a ração de trigo na hora certa? Feliz aquele servo que o senhor, ao chegar, encontrar agindo assim!  Em verdade, vos digo: ele lhe confiará a administração de todos os seus bens.  Ora,se um outro servo pensar: ‘Meu senhor está demorando’ e começar a bater nos criados e nascriadas, a comer, beber e embriagar-se,  o senhor daquele servo chegará num dia inesperado e numa hora imprevista, ele o excluirá e lhe imporá a sorte dos infiéis.  O servo que, conhecendo a vontade do senhor, nada preparou, nem agiu conforme a sua vontade, será chicoteado muitas vezes.  O servo, porém, que não conhecendo essa vontade fez coisas que merecem castigo, será chicoteado poucas vezes. Portanto, todo aquele a quem muito foi dado, muito lhe será pedido; a quem muito foi confiado, dele será exigido muito mais! (Lc 12, 32-48)

Obrigado, Senhor,
por me teres ensinado
o que às vezes, esqueço:

Onde estiver o meu tesouro
é lá que está o meu coração!

Que seja o meu tesouro
o Teu Santo Nome
e tudo o que dizes
e a que devo atender,
porque  é de Ti que me chega
todo o dom perfeito.
Consente, pois, que Te prefira
a todos os dons do mundo!

Tenho, Senhor,
o meu coração perto de Ti,
mas, porque sou fraco,
prepara o meu pensamento
para o tempo em que vais bater
à minha porta
e me encontres a agir como disseste.

E, assim, permite que eu seja
Teu fiel administrador!


sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Manuel da Silva Gaio (1860-1934)






Desde que, por não te ver,
Vejo em tudo noite escura
Resta-me só a ventura
De duvidar em dizer:

- Qual mais custa: se a tristeza
Dum adeus amargurado
Se a dura e firme certeza
De estar penando ateu lado.

in, Canções do Mondego

Nascido num lar em que a Academia tinha a honra que era devida ao saber, Manuel da Silva Gaio formou-se em Direito na Universidade de Coimbra - sua terra natal - enveredando, profissionalmente, pelo funcionalismo público em Lisboa e, mais tarde, na cidade que lhe serviu de berço, ocupando o cargo de Secretário da Universidade.
Do pai, António da Silva Gaio, o autor consagrado do romance histórico "Mário", herdou o Poeta o gosto pelas letras, a que dedicou a sua vasta e pujante veia artística.
No ano seguinte à publicação do seu primeiro livro: "Primeiras Rimas", em 1887, dedicou-se ao jornalismo, havendo-o  exercido entre 1888 a 1891, no jornal "Novidades" de que era, então, Director Emídio Navarro, como ele, homem de Direito, político e  brilhante jornalista.
Foi nessa época que conheceu Eça de Queirós, Director da "Revista de Portugal" que então se publicava, convidando-o para a secretariar, um facto que muito terá contribuído, pelo envolvimento no meio, para ter fundado em 1894 a Revista "Arte" de parceria com Eugénio de Castro.
Manuel da Silva Gaio foi um paladino acérrimo do "Integralismo Lusitano" - também conhecido por "Nacionalismo Integral" - um movimento político que se opôs ao anticlericalismo da 1ª República, tendo como matriz o municipalismo e a inspiração católica como fio condutor do sindicalismo que advogavam, com a defesa dos valores nacionais tendentes à harmonia e união social através da cooperação das diversas classes.
Esta tendência política onde não faltava ao Poeta o seu empenho de ordem intelectual, fê-lo abjurar a Monarquia Constitucional (1820-1834), mas também, a corrente favorável que levou à instauração da República.
Advogava, por isso, uma "monarquia orgânica e nacionalista", fundada num certo tradicionalismo que tendia a reatar o fio das instituições medievais adaptadas aos condicionalismos sociais da época que constituíam já na sociedade portuguesa um movimento que teria de ser atendido.
Bateu-se por essa razão contra uma aspiração fusionista (1) que vinda de Espanha encontrava em Portugal alguns aderentes, o que o fez apadrinhar movimentos conferencistas de esclarecimento das massas populares ao inculcar-lhes o fervor nacionalista.
A sua obra ressentiu-se da sua intromissão pública neste campo.
Aqui e ali está marcada pelo reavivamento de formas quinhentistas pelo renovar das lendas, costumes e sentimentos populares através de evocações de personagens e factos históricos relevantes.
Segundo os seus biógrafos reside aqui a parte menos valiosa da sua vida literária, pelo maneirismo que ele lhe imprimiu, podendo por isso dizer-se que Manuel da Siva Gaio foi um vagabundo espiritual: não acertou com o estilo literário próprio ou inserido em qualquer corrente do seu tempo.
Deixou, no entanto, de pé a causa que ele sempre defendeu ao arvorar-se num nacionalista convicto, mas sem ter entendido os ventos que começavam a soprar e iriam desembocar no parlamentarismo, o local exacto para a grande discussão das ideias.
A sua obra é vasta em prosa e verso.
Publicou:  "Primeiras Rimas" (1887); "Canções do Mondego" (1891); "Pecado Antigo" (1893); "Um Ano de Crónica" (1899): "O Mundo Vive de Ilusão" (1896); "As Três Ironias" (1897); "Na Volta da India" (1898), "Mondego" (1900); "Encruzilhadas" (1903); "A Dama de Ribadalva" (1903); "Últimos Centes" (1904); "Novos Poemas" (1906); "Torturados" (1911); "Clave Dourada" (1916); "Da Poesia na Educação dos Gregos" (1917); "Eça de Queirós" (1919); "Dom João" (1925); "O Santo" (1927); "Sulamite" (1928); "Eugénio de Castro" (1928); "Pela Ribeira do Mondego" (1929); "João de Deus" (1930); "Os Vencidos da Vida" (1931); "Bucolismo" (1933).
Campos de Figueiredo publicou em 1934 um estudo sobre os quase meio século de produção literária de Sila Gaio.
Não é fácil falar em breves palavras deste vulto das letras pátrias, mas o que fica dá dele indicações e proporcionar - é isso que se pretende - uma lembrança do literato a que alguns assacam a génese do "neolusitanisnmo", que advogava a feitura de uma poesia nacionalista, hoje, tão necessária pelo desmembramento intelectual que vivemos, entregues à proliferação de ideais globalizadas, sem alma e sem carácter regional.
Na sua fase lírica que ele expressa nas "Canções do Mondego" publicou o Poema "VINTE ANOS", onde diz assim:

Perguntavas-me de antes: que alegria
Ou íntima ventura
- Desde que, ao longe, apenas vinha o dia
Até ser noite escura -

Me fazia cantar a toda a hora
E me doirava a vida?
E perguntava-te eu: "Ó minha aurora,
Ó rola estremecida,

O que te faz também andar cantando
E rindo a cada instante,
Como se a vida fôra um sonho brando
Duma embriaguez constante?"
....................................................................
Negrejava a batina que vestia
Meu peito juvenil,
Como uma nuvem trágica e sombria
Toldando um céu de Abril.

E o teu vestido pobre até lembrava
- Cobrindo esse tesouro -
O folhelho do milho que, na seara,
Veste as espigas de oiro.

Mas nenhum de nós dois, então, daria
Por um trono radiante,
Esse pequeno quarto de estudante,
Que o nosso amor enchia.

E a janela por onde o doce alvor
Do dia nos saudava
E num beijo de luz acariciava
O teu craveiro em flor.

Pode dizer pouco à geração actual o nome de Manuel da Silva Gaio, mas não pode perder o sentido - a menos que queiramos esquecer a Pátria - o soneto que ele dedicou "À GERAÇÃO NOVA" do seu tempo e que devia continuar a ser intemporal no que concerne ao amor nacionalista que devemos à terra que nos viu nascer:
Pudera este meu livro, bons amigos
Alevantar-vos tanto o pensamento
Que à Pátria desseis braços e novo alento
Para afinal por termo a seus castigos.
Mas, se o cantar-vos eu feitos antigos
Não for mais do que vão cometimento
Se houverem de rendê-la, a trato lento
Duros golpes de feros inimigos,
Que - onde a mesquinha ergueu voz de grandeza
E os filhos já no exílio se dirão -
Ainda, por luso ser de natureza,
Ao lê-lo vós logreis ter a ilusão
De um punhado de terra portuguesa
E nele apertardes sempre a vossa mão!
in "Clave Dourada"
............................................................................
(1) - Ideia que assentava na fusão política

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

António Fogaça (1863-1888)


 
            Eu não acreditava
Que simplesmente a luz dum doce olhar
Tornasse a alma uma perfeita escrava.
 
            Contudo, ó flor sem par,
Quando ontem, passando, tu me olhaste,
Mal imaginas que no mesmo olhar
A alma me levaste.
 
In, Versos da Mocidade
 

António Maria Gomes Machado Fogaça nasceu  na povoação de S. Martinho de Vila Frescaínha, concelho de Barcelos e morreu na fulgor da vida, aos 25 anos, como se fosse uma flor  caída da haste no momento em que desabrochava.
Frequentava, então, o 3º ano de Direito na Universidade de Coimbra e o seu estro inspirado já o havia tornado um vulto conhecido através da colaboração que empreendera em algumas publicações.
O seu lirismo simbolista de que deu evidentes provas, e a sua prematura morte deixou na Academia um profundo pesar que transitou para a roda das tricanas que o admiravam sabendo de cor as quadras que ele dedicou às fogueira de S. João.
Mereceu de Joaquim de Araújo  (1) - o poeta e prosador que veio a ser cônsul de Portugal em Génova - uma sentida poesia no seu livro "Flores da Noite" e, também, de António Nobre, o nostálgico Poeta do "Só" que o evocou nos "Primeiros Versos".
António Fogaça, apesar da sua ilustração e aceitação nos meios literários não tinha deleites de excêntricas fantasias, nem dispunha o pensamento em vigílias de cultivo da sua personalidade, que era,  pelo que nos deixou no seu único livro "Versos da Mocidade", de uma rara beleza.
Na sua poesia "O Fumo" o Poeta após admirar as reviravoltas que o fumo faz ao sair das chaminés até desaparecer nas mais altas viagens, diz surpreso e com alguma melancolia:

Do meu quarto, que dá sobre os quintais,
Descubro todo o bairro; e, muita vez,
Vejo evolar-se o fumo em espirais
              Das negras chaminés.
...................................................................
 
Todo este quadro é tão banal, que então
Chego a rir-me de mim, do que resumo
Na minha eterna e doce aspiração...
            Que se assemelha ao fumo.
 
A vida foi-lhe, de resto, um fumo que subiu alto - e depressa - enovelado e eivado da aspiração natural dos jovens, que como ele, em qualquer tempo têm o direito de sonhar, até que um dia - por desnorte, omissão de arreganho ou falta de saúde  - deixam cair o sonho contra o primeiro vendaval.
António Fogaça caiu por falta de saúde no primeiro vendaval.
Profundo conhecedor da musicalidade das palavras que encadeou  em versos de métrica perfeita e ritmo de rara cadência, o Poeta deixou nas suas "Orações de Amor" perfeitos gritos de alma, que são orações para falar com Deus.
 
                 Ó rosas da manhã
Confio em vós, chorando, a vós imploro
Que, se aqui aparecer a vossa irmã
                Lhes jureis quanto a adoro.

                Mas contai-me depois
O que disse de mim, quando eu vier
Interrogar-vos sobre a minha sorte,
Como quem vai, tremendo, sem saber,
Se encontra a vida ou se o assombra a morte.
 
Ou, então:
 
Hei-de dar-te um palácio com mil portas,
Que encerre tudo quanto fantasiarmos:
-Rosas, volúpia, sonhos, afeições...
A porta mais pequena é para entramos
E são as outras para as ilusões.
 
Bem cedo, as ilusões se esfumaram na alma do Poeta.
Ele, bem se pode dizer, entrou pela porta estreita da vida para deixar abertas as outras, por onde as suas quimeras entraram aos baldões.
Uma das suas quimeras deixou-a vincada no formoso soneto "Desgostosa".

O seu riso gentil que ainda me arrasta
Como quem vai seguindo no deserto
Os raios dum clarão que julga perto
Mas que a segui-lo toda a vida gasta;

Sua voz, seu olhar, sua alma casta,
Todo esse altivo e festival concerto
- Brancas formas de luz que ao seio aperto
Sonhadamente, numa dor nefasta...

Esse porte de brilho e majestade,
E o seu modo sincero, doce e honesto,
Tudo a sombra da Mágoa, sem piedade,

Velou, tocando-a com o seu ar funesto!
Nunca eu sonhasse, ó intima saudade,
Seu riso, voz, olhar, e alma e gesto!...

António Fogaça foi um homem de sonhos.
Sonhou com a pujança da juventude a vida que ele - com a naturalidade própria da idade - queria acarinhar com toda a variedade de sonhos, sem suspeitar que lhe estava reservada a porta pequena por onde entrou e saiu, deixando atrás de si um império de vozes a reclamar a sua veia poética, perdida como o fumo que ele cantou num certo dia.
A Freguesia de Vila Frescainha de S. Martino, extinta em 2013, para comemorar os 150 anos do nascimento do Poeta descerrou um monumento em sua honra no dia 25 da Maio de 2013.
Funciona no Bairro da Misericórdia a Escola EB1 António Fogaça, o que prova, que a gente da sua terra não esqueceu o homem que na curta vida que viveu soube encher de luz o seu nome e a pequena - mas eloquente -  obra literária que nos deixou.
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(1) - Joaquim António de Araújo e Castro (1858-1917) nasceu em Penafiel.
 

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Camilo Pessanha (1867-1926)

  
 
in, Wikipédia
  
O Poeta nasceu em Coimbra em 1867 e faleceu em Macau em 1926. É contemporâneo na Universidade daquela Cidade onde se formou em Direito, de Eugénio de Castro, António Nobre e Alberto Osório de Castro.
Assistiu à nascença do simbolismo, um movimento literário surgido em França por volta de 1885 na procura através do valor musical e simbólico das palavras, das mudanças mais subtis das impressões e dos estados de alma.
Não se tendo deixado absorver pelas polémicas doutrinárias que aquela corrente literária substanciou, ficou aquém de todos os bulícios e estribando-se em profunda reserva interior, tornou-se algo abúlico e criador de extremismos ao ponto de não gostar de publicar as suas poesias, que não deixou, no entanto, de as impregnar de um profundo simbolismo.
Na procura da distância e de evitar o ruído, tornou-se indiferente à publicidade, reservando com minúcia a escolha dos seus amigos íntimos, como os primos, Ana de Castro Osório e Alberto Osório de Castro, tendo cabido a este a publicação em 1889 no Jornal "O Novo Tempo" que se editava em Mangualde, do célebre poema "Estátua", que se crê inspirado pelo amor de Camilo Pessanha pela jovem Ana de Castro Osório, representando a frieza recebida por algumas mulheres por quem o seu coração bateu.
O Poeta viveu em Macau a parte final da sua vida, tendo ali exercido funções judiciais. O contacto estreito com a cultura chinesa originou que tenha escrito vários estudos e feito traduções de poetas oriundos da China.
Com pundonor, Pessanha cultivou um perfil algo estranho, onde a sua barba negra impunha um toque oriental, saindo-lhes das órbitas dois olhos ardentes e interrogadores do mundo, que antes de se fecharem ainda assistiram ao legado dos objectos de arte chinesa que possuía ao Museu de Machado de Castro, em Coimbra. (1)
Segundo os estudiosos os seus poemas simbolistas tiveram preponderância espiritual em Poetas como Sá-Carneiro e Fernando Pessoa, a quem se ficou devendo, em primeiro lugar, a iniciativa da publicação das suas poesias.
É deste modo que em 1920 sai para o público o seu livro "Clépsidra", fazendo lembrar pelo nome os relógios de água do antigo Egipto, como se o Poeta quisesse marcar o tempo através da água profunda que corre dos seus sonetos, arte de que foi um exímio burilador.
Essa arte maior herdou-a ele, na esteira de grandes vultos, como: Camões, Bocage e Antero de Quental.
O soneto "Estátua" é, efectivamente, um retrato do seu perfil poético:
 
Cansei-me de tentar o teu segredo;
No teu olhar sem cor, frio escalpelo,
O meu olhar quebrei, a debatê-lo,
Como a onda na crista dum rochedo.
 
Segredo dessa alma e meu degredo
E minha obsessão! Para bebê-lo
Fui teu lábio oscular, num pesadelo,
Por noites de pavor, cheio de medo.
 
E o meu ósculo ardente, alucinado,
Esfriou sobre mármore correcto
Desse entreaberto lábio gelado.
 
Desse lábio de mármore, discreto,
Severo como um túmulo fechado,
Sereno como um pélago quieto.
 
Nesta composição, o Poeta pareceu querer personificar as pessoas com as quais teve, ao lingo da vida, dificuldades de comunicação ou de quem não recebeu aquilo que o seu sentimento pedia, fosse um gesto de amizade ou de amor.
O soneto, propositadamente designado "Estátua", esconde, assim, uma intuição humana onde está vivo o drama do homem cujo interior magnânimo nem sempre conseguiu encontrar o reconhecimento de quem o estimasse.
Daí, o seu refúgio em si mesmo, sem a correspondência humana que ansiou e desejou, donde podemos aquilatar o sentido doloroso do primeiro verso: Cansei-me de tentar o teu segredo, revelando -se aqui, o gosto de descobrir - seja-se poeta ou não - aquilo que vive escondido, às vezes, no simples olhar, que Pessanha afirma ser o da pessoa que lhe inspirou o soneto e que ele apelidou de frio escalpelo, onde o seu próprio olhar se quebrou.
O Poeta surge neste poema como em muitos que compõem o livro "Clépsidra" com uma ânsia de perfeição, na busca de encontrar palavras exactas que melhor pudessem transmitir o seu sentimento, como se em cada uma das palavras beijasse quem lhe fugia.
Camilo Pessanha merece ser lido, meditado e sentido, como homem e poeta de grande estilo literário.